16 de fevereiro de 2007

Clube Literário do Porto homenageia José Afonso

Clube Literário do Porto homenageia José Afonso no mês em que se assinala 20 anos sobre a sua morte
Estrela na constelação da utopia«20 Anos de Caminho» é o tema da homenagem organizada pela Associação José Afonso e que decorre até amanhã no Clube Literário do Porto. O serão de anteontem foi dedicado aos testemunhos de dois grandes amigos do cantautor, Alípio de Freitas e Benedicto Garcia Villar.

Goreti Teixeira

O dia foi dos namorados, mas a noite foi dedicada a lembrar aquele que ainda hoje é considerado um dos mentores da música de intervenção em Portugal: José Afonso. Este ano assinalam-se 20 anos sobre a sua morte e, um pouco por todo o País, as iniciativas sucedem-se para recordar não só o músico, mas o homem e militante político que utilizou a música como instrumento de luta em prol de um mundo melhor. Anteontem, o Clube Literário do Porto abriu as suas portas à homenagem «20 Anos de Caminho», organizada pela Associação José Afonso, que termina amanhã, com um debate em torno da música e para o qual foram convidados Francisco Fanhais e José Mário Branco. Em vez das rosas, os cravos vermelhos decoravam a sala. Em vez da música romântica ecoava a «Grandola, Vila Morena» através de uma gravação inédita que registou a primeira vez em que o tema foi cantado na Galiza. Sentados à mesma mesa estiveram Alípio de Freitas, presidente da associação, e Benedicto Garcia Villar, cantor galego, que durante anos acompanhou José Afonso. Ao longo de mais de uma hora, ambos falaram das suas vivências pessoais com o cantautor. Alípio de Freitas recusou-se a falar especificamente da obra, pois não se considera um estudioso “como aqueles que organizaram toda uma teoria sobre o Zeca e que jamais lhe teria passado pela cabeça, porque ele nunca planeou nada. Ia avançando de acordo com a sua percepção e, por isso, esteve sempre no lugar certo”, disse o orador que, aos 26 anos, parte para o Brasil, onde começou a sua grande experiência de vida. “Fui preso, torturado, exilado, lutei contra a ditadura na América Latina e só ouvi falar de Zeca Afonso quando, depois de ter enviado uma carta para Portugal, me apercebi que do outro lado estava alguém que se preocupava com a luta que estávamos a travar”, explica. Mas apesar da distância e do desconhecimento, Alípio de Freitas recorda que a primeira vez que o viu, em 1980, “abracei-o e achei que o tinha reencontrado e não que o estava a conhecer”. Um sentimento mútuo que perdurou até aos últimos dias de vida do músico, quando Alípio se tornou o seu repórter pessoal lendo-lhe todos os jornais e revistas, contando-lhe as intrigas políticas, “porque grande parte das pessoas que o visitavam pareciam que estavam num funeral”, constata. “Com ele – continua – aprendi imensas lições: a da solidariedade, a da amizade e do estar atento ao mundo que me rodeia e compreendi o sentido de todas as suas canções, porque nada nele foi casual”. Para este amigo, José Afonso, assim como Camilo Torres, Che Guevara, Adriano e outros nomes mais que “deram a vida pela utopia, por um mundo melhor” não estão em parte incerta, são “estrelas na constelação da utopia e, destas estrelas, os astrónomos não percebem nada”, assegura.
Benedicto Garcia VillarCompanheiro de ViagemJuntamente com José Afonso, Benedicto Garcia Villar andou, segundo Alípio de Freitas, “a incomodar aqueles que eram os senhores do poder e só não o fizeram mais porque não lhes foi permitido”. Um privilégio que o ex-cantor galego afirma “não se poder resumir em palavras”. Para complementar o seu testemunho pessoal trouxe um conjunto de documentos escritos e áudio e fotografias inéditas que são o registo dos muitos momentos vividos por ambos e que intitulou de «História de uma amizade incombustível». A primeira vez que ouviu José Afonso foi através do disco «Traz outro amigo também» e, juntamente, com um grupo de amigos partiu em direcção a Portugal para o conhecer.

Notícia da edição on-line do "Primeiro de Janeiro" 16 de Fevereiro de 2007

1 Comment:

Edward Soja disse...

Retenho-me nas últimas linhas desta notícia. Quando se diz que Benedicto partilhou com os presentes documentos áudio.
Ora, já tinha lido, no livro de Eduardo Raposo, que, quando este foi à Galiza para o conhecer e entrevistar, veio de lá com uma grande amizade e também um documento áudio.
E pergunto-me: e a Associação? Dispõe de uma cópia?
Será difícil, ou está há muito prevista, a edição, da própria AJA, com essas gravações?

Porque não? E porque não também o concerto de Hamburgo?
A força é muita, da parte de todos os admiradores do Zeca, suponho.

Pelo menos, essa é uma esperança que desejaria ver concretizada.

Um abraço a todos os leitores do Vejam Bem.

Eduardo, de Braga