9 de dezembro de 2005

Direitos de reprodução na RDP

Caro Sr. Manuel Freire,

Foi com muito interesse que o ouvi no programa "O Amigo da Música" em conversa com José Nuno Martins. Tenho uma dívida de gratidão para consigo porque foi graças às suas primorosas baladas que tive o primeiro contacto com a poesia de António Gedeão, pseudónimo de Rómulo de Carvalho, cientista e professor de Físico-Químicas. Infelizmente, as suas belíssimas e tocantes interpretações deixaram de passar na rádio pública, o que não deixa de ser absurdo numa estação que põe no ar o jingle "Antena 1 – uma rádio com memória". Manuel Freire queixou-se – e com inteira razão – que José Afonso não tem passado na rádio portuguesa e que continua a passar na Galiza, tal como acontece – acrescento eu – com Fausto Bordalo Dias, por exemplo. Mas atribuir isso ao destino denota uma atitude de resignação fatalista que não estava à espera de alguém a que me habituei a ver como um contestatário e um inconformista. Eu não me resigno perante supostas sinas ou fatalismos porque acredito que são as pessoas que constróiem o seu destino. Não foi nenhuma força sobrenatural que arredou os nomes mais representativos da nossa música da rádio pública mas sim seres bem terrenos que com a sua subjectiva discricionaridade se arrogaram em bani-los mostrando não só uma tremenda falta de respeito pelos artistas mas também pelos ouvintes. Pela minha parte nunca poderei aceitar tal atitude que além de censória e de lesa-cultura é atentatória dos meus elementares direitos enquanto cidadão, contribuinte e ouvinte. Como o Estado me exige que cumpra os meus deveres de cidadão e de contribuinte, o mínimo que eu posso exigir em contrapartida é que o Estado (no caso concreto, a RDP-Antena 1) respeite os meus direitos. E seria também importante que a SPA pugnasse também para que os autores que representa - poetas, compositores, músicos e cantores - fossem objecto de um tratamento digno por parte da rádio pública e não se limitasse ao papel burocrático de receptadora e distribuidora do dinheiro que recebe da RDP, não fazendo nada em defesa dos associados que estão a ser ostensivamente censurados. Parte do dinheiro que a RDP entrega à SPA em sede de direitos de reprodução provém do meu bolso e, como tal, eu nunca me conformarei que dele não beneficiem os nomes de maior mérito e, ao invés, vá engordar as contas bancárias de medíocres que pouco ou nada contribuem para o enriquecimento do nosso património musical.

Apreciei que tivesse oferecido um disco do grupo Segue-me à Capela ao José Nuno Martins. Conforme já tive oportunidade de dizer ao autor do programa "O Amigo da Música", tomara eu que nos alinhamentos musicais de continuidade da Antena 1 se pudessem ouvir muitos dos nomes que ele divulga. Por isso, seria pertinente que o Sr. Manuel Freire, na qualidade de presidente da direcção da SPA, tomasse a louvável iniciativa de também oferecer discos de Segue-me à Capela, e de outros nomes de talento da nova geração da música tradicional, ao chefe de 'play list' da Antena 1 porque ele só tem olhos para a música pop votando a um intolerável ostracismo não só os nomes consagrados mas também os projectos emergentes mais interessantes da música de raiz ou inspiração tradicional. Armando Carvalheda tem a preocupação meritória de convidar alguns deles para os concertos do "Viva a Música" mas depois inexplicavelmente nunca aparecem na 'play list'. E representando os espaços musicais (fora dos programas de autor) o grosso dos direitos de reprodução pagos pela RDP à SPA seria de extrema importância que fosse dada uma atenção muito particular à 'play list' por forma a serem corrigidos os desequilíbrios e as distorções que ela tem actualmente.

Com os melhores cumprimentos,

Álvaro José Ferreira

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