Avisado que estava, lá fui, na noite de quinta-feira, dia 26.01.06, até ao Puinguim Café,no Porto, para assistir ao evento que o núcleo do norte da Associação José Afonso ali realizava sob o título "a poesia do Zeca".
O espaço, simpático e bem iluminado, infundia visivelmente uma agradável sensação de bem-estar, em todos os presentes, que aguardavam o começo da sessão.
E não podia ter sido melhor! Após as habituais saudações de boas vindas, uma voz, cuidada, eleva-se a recitar "utopia" criando, logo ali, momentos únicos de sensibilidade.
Todo o ambiente se tornou concordante àquela evocação poética.
Seguiram-se outras vozes e outros poemas e ... às tantas, o dedilhado de uma viola cresce na sala e uma voz canta "era um redondo vocábulo".
Ah! Como estas cantigas avivam, na nossa memória, a figura do Zeca!
São momentos de pura emoção, estes.
Passados quase vinte anos da sua morte, Zeca Afonso ainda nos interpela, mobiliza e fraterniza em torno de valores fundamentais.
Que falta que faz Zeca Afonso para cantar esta carnavalização em que nos movimentamos; esta patológica obsessão consumista; esta epinafania medíocre em que vamos vivendo!
Que falta que faz o seu cantar para nos despertar desta letargia a que nos acostumamos!
Deste estado de resignação, sem força, sem vontade e sem revolta em que nos
comprazemos! Deste inanismo mental que nos faz aceitar tudo ...
Pobres de nós! Que falta que nos faz o Zeca!...
Outros poemas, outras cantigas e outros momentos de grande poder emotivo foram acontecendo no decorrer da sessão.
Ninguém arredara pé. Todos queriamos prolongar aquele momento de enlevo e reverência evocativa exaltante.
Foi bom!
É claro que não se falou ali, e nem era suposto falar-se, pelo menos em discurso directo, das grandes desgraças que grassam no mundo:
A guerra, que é feita em nome da paz, da democracia e da vida, e só traz ruína,
destruição, miséria, morte e mais guerra.
A fome, que apesar de nunca terem sido tão abundantes os géneros alimentares e as possibilidades de produção de alimentos, mata todos os dias, milhares de pessoas.
A pobreza, que cresce exponencialmente, gerando nas metrópoles, milhões de sem-abrigo.
A doença, que lógicas económicas e políticas absurdas, em cada dia que passa, deixa que mais de trinta mil crianças morram de doenças perfeitamente curáveis ...enfim, nada disto nem do muito mais que conspurca o mundo, foi ali falado.
Era apenas uma sessão evocativa! Mas foi bom. E tal como me dizia uma amiga à saída: "- Ui! Andava com tanta fome disto! Vou satisfeita!"
Também eu saí satisfeito. Valeu a pena!
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